05 outubro 2008

Sara Sampaio – Laboratório de som e imagem 2007/2008


“Existe um círculo em todos os objectos que tem um movimento natural. Isto se deve ao facto dos objectos serem discriminados pelo tempo, o início e o fim estando em conformidade com um círculo; porque até mesmo o tempo deve ser pensado como circular” (Aristóteles).

Na transitoriedade eu me desmaterializo/desconstruo, eu me fragmento pela representação, acreditando que com isso me estou a encontrar de alguma maneira, me estou a encaminhar para o futuro (que será conhecer-me). Essa visão do assistir-me encaminhando-me quer para o meu passado, quer para o meu futuro, posso relacioná-la com o movimento cíclico, o de loop.

Parar o tempo é quase uma caimbrã no ‘músculo temporal’, mas ele permite-nos olhar-nos olhos nos olhos, num dado momento que fomos. Somos se calhar, constantemente transitivos.

Continuo de certa forma neste trabalho o projecto de auto-representação de design, utilizando e recitando o texto auto-representativo da disciplina, onde o conceito principal seria o da fronteira/ que é passagem, que conduz á transição, Cellardoor, e também está aqui muito do meu trabalho de cultura e tecnologia no conceito de transição.

Represento-me com um grito, e de certo modo com o texto que recito, mas esse é apenas complemento. Gritar é “sair de dentro”, mas é também trazer o que está dentro para fora. É por isso que interior e exterior não funcionam como antagonismos, mas antes princípios completares, não sinónimos, mas mutuamente construtores um do outro.

Gritar, é estar em transição onde o corpo é fronteira. Transição pressupõe inicialmente uma sensação de futuro, mas ela é tão mais que isso.... Transição é presente, é o toque nessa fronteira. O contacto pressupõe fronteiras e passagens. Ser ponte. Estar em transição é então ‘ir conhecer’, estar realmente Aqui, existir. Gritar é estar presente.

“È impróprio afirmar que os tempos são três: passado, presente e futuro. Mas talvez fosse próprio dizer: os tempos são três: o presente das coisas passadas (…), o presente das presentes (…) e o presente das futuras (…) existem, pois, três tempos na minha mente que não vejo em outra parte: lembrança presente das coisas passadas, visão presente das coisas presentes e esperança presente das coisas futuras.” (Santo Agostinho, em ‘Confissões’).


Corpo é então fronteira, porta, e o grito a extrapolação, a assistência de mim. Deixo o grito durante toda a faixa do texto, aumentando-lhe a duração, fazendo-a talvez permanecer,… O texto audível tentei que se tornasse repetível, com tempos desfasados, convidando a um assistir que começa de modo racional, mas que se vai ‘perdendo’ (ganhando) num efeito quase anestesiador, que se perdendo num sentido consegue ganhar em outro. Nesta repetição, tentei tornar o tempo circular, escrevendo um texto que quando acaba pode começar. Este sentido circular consegue acentuar ainda mais essa ideia hipnótica do som, onde a repetição deveria dar lugar á extrapolação, ‘ao assistir-me passando

Há algo de imensamente temporal em tudo isto, a ‘passagem’ do ‘sentido’ para a ‘representação’ que é no fundo uma ‘transição’. Cellardoor, na qual nós provocamos um constante abrir e fechar de portas para ‘a nossa passagem’, a ‘nossa transição’. Representamo-nos numa tentativa de conceber ‘o nosso sentido’ é quase como assistirmo-nos, saindo de nós, é também ficcionarmo-nos, sermos tudo e não sermos nada, sendo um eterno paradoxo. Transição reenvia-nos estranhamente para uma referência originária, um todo longínquo e imaterial, que é estranhamente e claramente feito em um presente. Transição supõe a desconstrução, desmaterialização que obtém um sentido totalizante e uno.


eu passo novo.aiff -

04 outubro 2008

Sara Sampaio
Laboratorio de som e imagem
Proposta 2

"What is TIME?? If no one asks me, I know ... if some one asks me, 'I know not.' (St. Augustine)

Tempo sempre esteve de certa forma ligado ao conceito de movimento. O tempo pressupõe um avanço, uma gradação. Ele indica uma acção que evolui (de que maneira for), pois o tempo nunca pára. Com a sua mania de querer controlar tudo e impotente perante o facto, de o tempo lhe escapar ao domínio, o homem cria a fotografia. Assim, ele já consegue congelar. Consegue guardar fisicamente uma acção, um instante de acção. A fotografia, foi o inicio, o inicio de uma era que tornaria o tempo manipulável.

A linha de tempo é quase como uma imensa narrativa, da qual não conhecemos o meio, nem sabemos se tem um fim,… o homem criou as narrativas, tal como descobriu o sexo, e criou-as com um início um meio e um fim. Como no cinema, “It’s like a Greek tragedy and human beings’ time-based satisfaction has remained unchanged for over 4000 years, maybe it’s unchangeable. It’s maybe based on sexual forms of satisfaction.” (Nam June Paik). No cinema a narrativa prende-se com estes valores, mas já começa aí a transformação. A acção é gravada, em tempo real, mas a película permitiu, que se lhe aumentasse o suspance nas histórias. Surgia assim a edição dos filmes. Que inicialmente, tida como um trabalho de menor importância era deixada para as mulheres.

Foram assim, dados os primeiros passos contra o tempo. Pois todos os passos têm como pressuposto isso, pois será a única coisa que nunca será dominável pelo Homem, tal como a natureza. Ir contra ao tempo é assim, ou parece-nos assim, contra-natura.

Hoje, a vídeo-art constitui a possibilidade de brincarmos com uma máquina do tempo, embora virtual. Parece termos todas as possibilidades. O controle. E no entanto ela causa estranheza. A narrativa não necessita agora de um início, um meio e um fim, ou pelo menos não por esta ordem. O loop. Ele conduz o fim ao início, confunde os dois, absorve-os. Ele renova os princípios da narrativa.anheza.ideo digital repetiçconde menos por esta ordem.

Movimento associa-se a vida. O loop manipula essa representação de vida, ele consegue enfatizar ou mascarar pela repetição, “In my case, it’s a total length macro form and micro form. This time length, time span, is for me very important” (Nam June Paik).

Mas repetição parece tão contraria á questão de tempo, ou vida,… mas hoje, talvez tenha deixado de sê-lo, virtualmente claro.

Na era digital o tempo já não é linear, tornou-se manipulável. É artificial, uma brincadeira de deuses. O tempo é já, digitalmente falando, reverssível. “Video art imitates nature, not in its appearance or mass, but in its intimate "time-structure" . . . which is the process of AGING (a certain kind of irreversibility”. (John Hanhardt, in Nam June Paik site introduction).


«“Edmund Husserl, in his lecture on "The Phenomenology of Inner Time-consciousness" (1928), quotes St. Augustine (the best aesthetician of music in the Medieval age) who said "What is TIME?? If no one asks me, I know ... if some one asks me, 'I know not.' "This paradox in a twentieth-century modulation connects us to the Sartrian paradox "I am always not what I am and I am always what I am not."6 -Paik, 1976.» (John Hanhardt, in Nam June Paik site introduction).